quarta-feira, 16 de agosto de 2017

CARTA AO GOVERNADOR: Cândido Sales-BA, 16 de Agosto de 2017.

Senhor governador a nossa singela carta visa chamar a atenção das autoridades públicas do Estado da Bahia a respeito do nosso Território Municipal e seu em torno. Como candidosalense, reconheço a importância da obra da adutora que leva água tratada aos munícipes do interior do município e me sinto feliz em ter o chefe do executivo estadual aqui conosco em nossa cidade.



O que me aflige governador Rui Costa é a falta de perspectiva de desenvolvimento social, econômico e ambiental em nossa região. Cândido Sales integra o Território de Identidade de Vitória da Conquista que é composto por 24 municípios. As cidades da região estão fora do eixo econômico tradicional do Brasil e da Bahia e a maioria são municípios pobres cujas populações dependem dos subsídios do governo para terem assegurados direitos básicos.

Embora a nossa região seja composta por 695.302 habitantes (IBGE/2010), somos responsáveis por gerar apenas 3,5% do PIB estadual, sendo o município de Vitória da Conquista o responsável por mais de 50% do o Produto Interno Bruto da região.

Sendo assim caro governador, democrata e estudioso como és, deve imaginar a agonia de nós brasileiros desta região do país diante do desafio imposto no processo de sobrevivência em Cândido Sales e nos demais municípios do Centro-Sul baiano. Precisamos de garantias que demonstrem que o poder público estadual está tomando providências para criar a infraestrutura necessária para que se encerre o triste ciclo expropriatório nesses municípios, que vêm, ao longo de décadas, abastecendo as regiões metropolitanas com mão-de-obra barata e aumentando os bolsões de pobreza no país.

Fazemos parte do Semiárido brasileiro e sofremos as consequências desse clima, o bioma predominante do município de Cândido Sales é a Mata Atlântica, hoje em dia, com apenas 6% de floresta nativa em nosso Território a impressão que se tem é da predominância da caatinga, a atividade humana ao longo da formação desses municípios é que definiu esse panorama ambiental da região. Somos uma região rural.

O município que possui uma das menores populações rurais do Território de Vitória da Conquista tem 30,9% da sua população residindo no campo e faz fronteira com dois dos cinco municípios de maior população rural da região (Encruzilhada e Tremedal), como se sabe, a maior concentração de pobreza no Brasil ocorre no campo, e onde há pobreza e miséria, a barbárie vagueia soturna, sendo fundamental um maior conhecimento técnico das autoridades públicas do Estado da Bahia, para atuarem com mais efetividades na região.

As cidades da região de Vitória da Conquista – BA são vocacionadas à agricultura e pecuária na modalidade familiar, no entanto, nunca receberam os incentivos necessários da parte dos agentes públicos locais, Universidades e governos. O resultado disso é um grande potencial econômico e social desperdiçado. O município de Cândido Sales já foi o maior produtor de mandioca do Brasil, sediou seminários regionais de importância nacional, no entanto, perdeu a sua competitividade de maneira tão abrupta que está ficando mais barato comprar os derivados da mandioca do Estado do Paraná que dos produtores locais.

Cada um desses 24 municípios da região possui a sua atividade rural de destaque, criação de gado, leite, café, feijão, milho, agricultura de modo geral. Essas potencialidades estão morrendo a míngua pela falta de investimento público e incentivo para a Pesquisa e Desenvolvimento do meio rural da região através das Universidades e dos Institutos do Estado e da União. A secretaria de estado que se responsabiliza pela Agricultura Familiar, precisa desenvolver metodologia na qual identifique as potencialidades de cada Território Municipal e os incentive de todas as formas para que os municípios voltem a produzir e se tornem agropólos, focados na produção sustentável de alimentos.

Precisamos nos preparar, desde já, para que possamos contribuir com a produção de alimentos nos próximos anos, as projeções da ONU indicam o aumento da população Mundial para 9 Bilhões de habitantes em 2050 o que, segundo os mesmos estudos, exigirá o aumento da produção de alimentos em 60%. Desse modo, precisamos garantir que os municípios rurais da região de Vitória da Conquista tenham condições de se inserirem de maneira competitiva nesse mercado futuro, principalmente, através da Agricultura Familiar.

É necessário criar as bases para o desenvolvimento rural sustentável em nossa região assegurando as condições para a permanência do homem no campo e criterizando a utilização dos recursos hídricos e insumos necessários à produção, de modo a impedir a disputa desleal entre e pequeno agricultor e o agronegócio. O município de Cândido Sales sofre as conseqüências da falta de políticas estruturantes para o meio rural, os pequenos produtores estão desestimulados para continuar, os jovens estão deixando o campo, enquanto isso, grandes produtores de fora do município implantam empreendimentos rurais gigantescos em questão de dias no território.

Inclusive, senhor governador, nós aqui de Cândido Sales estamos participando de uma importante articulação com os municípios banhados pela Bacia Hidrográfica do Rio Pardo, já entendemos que o melhor caminho para a recuperação e o desenvolvimento sustentável através do recurso hídrico é a criação do comitê de bacia como orienta a legislação. O diálogo entre as entidades e movimentos sociais da Bahia e Minas gerais, vem ocorrendo desde Julho de 2015 a partir do encontro no município de Canavieiras-BA, onde o rio deságua no Oceano Atlântico. De lá pra cá o debate avançou muito, e cada vez fica mais claro a necessidade de os municípios se organizarem para compartilharem responsabilidades através do comitê de bacia.

O fator humano é o mais prejudicial à bacia do Pardo, assim como a grande maioria das Bacias Hidrográficas do Mundo, essa relação do curso d’água com as populações humanas existe desde os primórdios da civilização. No entanto, atingimos no século XXI níveis críticos que nos remete, irremediavelmente, a refletir sobre a maneira predatória com a qual nos relacionamos com os recursos naturais. Desmatamento, poluição, assoreamento, captações ilegais, são alguns dos fatores que prejudicam a sobrevivência do Rio Pardo.

A ausência de matas-ciliares em determinados trechos da bacia potencializa ainda mais o aterramento do leito do rio, principalmente na região denominada como Médio Rio Pardo que vai do município de Cândido Sales até a cidade de Potiraguá, essa região é caracterizada como sendo de baixa recuperação de vazão do rio, o represamento ilegal e a emissão de outorgas sem critérios transparentes, estão modificando o ecossistema do Rio Pardo e levando à falta do recurso hídrico para a captação da Embasa em determinados períodos do ano, isso já aconteceu em Cândido Sales e Itambé, sendo o segundo município ainda mais afetado, ou seja, uma questão de insegurança hídrica.

Algumas medidas que foram tomadas pelo poder público local, mas, principalmente, da parte da iniciativa dos irrigantes, produtores de café que estão situados da barragem para baixo, esses agentes foram obrigados a procurarem a ANA para equacionar a disputa da água entre o consumo o humano e a irrigação de grandes lotes. Esses mesmos produtores, que ajudaram a assegurar os 444L/s necessários para a Embasa fazer a captação e levar a água até a casa das pessoas, defendem a tese de que se as contensões irregulares acima da barragem não existissem, o rio teria capacidade para atender a todos os interessados.

A discussão segue, o último encontro de articulação que tivemos, ocorreu no município de Ribeirão do Largo, com a presença do Poder Público, das entidades e movimentos sociais dos quatro municípios que compõe a nossa microbacia (Cândido Sales, Encruzilhada, Ribeirão do Largo e Itambé). Neste encontro estava presente o representante da Secretaria de Meio Ambiente da Bahia que nos esclareceu e levou muitas reivindicações dos municípios da região ao titular da pasta, inclusive, queixas que talvez não fossem nem da alçada da SEMA, como as queixas quanto a falta de investimentos em infraestrutura na região, como esgotamento sanitário, por exemplo, e assim todos fizeram questão de transmitir a preocupação quanto às precariedades existentes.

O representante da Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia também foi questionado acerca da falta de informações técnicas sobre a bacia do Pardo, enquanto o Estado de Minas Gerais possui farto material sobre o Rio Pardo em seu Território, não se encontra informações semelhantes do lado baiano, o que dificulta o debate sobre a criação do comitê de Bacia em nosso Estado. Embora a metodologia seja de utilizar os planos de bacia como referência para o desenvolvimento das políticas públicas para o setor, o Estado da Bahia não dispõe de um amplo estudo acerca dos seus recursos hídricos do Território, se existe tal estudo, ainda não foi publicado em canais acessíveis a todos os cidadãos.

Caro governador, resolvi colocar essas informações, narrando esses fatos da nossa realidade confiando da na sua sensibilidade e empatia, além do seu compromisso de homem público republicano> O objetivo não é questionar a estratégia de vosso governo para os baianos desta região, no entanto, ao trazer esses relatos a intenção é, humildemente, auxiliá-lo a compreender a nossa complexa realidade nas diversas áreas: econômica, social e ambiental.

O nosso município e, acredito que os demais da região de Vitória da Conquista também, estão participando de amplo processo de discussão sobre diversas áreas: saúde, educação, segurança pública, recursos hídricos, desenvolvimento rural etc. As pessoas estão preocupadas sobre como será amanhã. Na segurança pública a região vive em permanente crise, Vitória da Conquista, considerado um dos dez melhores lugares do país para se viver, paradoxalmente, já figurou também como um dos mais violentos municípios do Brasil.

A ruralidade da nossa região também deve ser levada em conta na estratégia de segurança pública adotada pelo Estado, reconhecemos o esforço do governo estadual na reestruturação e fortalecimento da Polícia Militar na perspectiva de uma polícia comunitária, novos concursos estão sendo feitos, no entanto, o efetivo existente ainda é insuficiente para atender a necessidade de segurança de todos os baianos, e os mais prejudicados acaba sendo os que residem no campo, pois além de o número de policiais ser insuficiente, a estratégia adotada pela PM, tem como referência a zona urbana. Desse modo, para a região de Vitória da Conquista seria necessária a implantação de uma brigada rural da PM, com modus operandi e bases que favoreçam a sua atuação nesta região do Estado.

Nos reunimos no último dia 14/08 com o responsável pela 80ª CIPM  de Polícia e Delegado de Polícia Civil que atuam no Território Municipal de Cândido Sales, embora tenham prestado conta das suas ações e demonstrado grande volume de trabalho, os representantes das duas polícias reconheceram as dificuldades para atuarem. A polícia civil, que se encontra com o seu pessoal reduzido e o delegado atuando em mais municípios além de Cândido Sales, não está dando plantão na cidade a partir da sexta-feira, sendo necessário o deslocamento até Vitória da Conquista para registrar um Boletim de Ocorrência. Os agentes públicos afirmaram que tal situação é consequência das medidas de contenção de gastos que partiram do vosso governo.

O fato é caríssimo governador da Bahia que enquanto escrevo essa carta ao senhor, soube aqui que mais um candidosalense morre assassinado por volta das 23:00 de 15/08. Os modus operandi os mesmos das dezenas que já perderam a vida aqui e que não tiveram seus casos elucidados pela Polícia Civil e os culpados não foram punidos. Nesse clima de faroeste e de impunidade as pessoas adoecem devido à sensação de insegurança e descrença nas autoridades.

A situação mais dramática ocorre quando o município fica desguarnecido sem as viaturas que às vezes, precisa escoltar presos que são levados às autoridades até Vitória da Conquista nos finais de semana, quando a delegacia local não funciona. Quando isso ocorre a vulnerabilidade da comunidade aumenta ainda mais. Desse modo, fica explicito a necessidade de um aperfeiçoamento tático na atuação da Polícia Civil aqui em nossa região, devendo ocorrer o quanto antes a realização de concursos para delegados e agentes, em número suficiente para assegurar a paz e a tranquilidade de todos os baianos.

Outro aspecto importante senhor governador é a pouca quantidade de promotores de justiça titulares na região de Vitória da Conquista, das 12 comarcas, apenas 04 possuem promotores titulares, a maioria dos municípios têm a presença de um promotor por apenas algumas horas em um dia da semana. Essas poucas horas existentes são disputadas entre as demandas do direito criminal e os demais direitos do cidadão. O direito criminal sempre ocupa a maior parte do tempo do promotor-substituto, pois precisa realizar audiência e acompanhar processos de réus presos. A ausência de promotores titulares propicia o descumprimento da constituição em nossa região e à prática de crimes de toda natureza.

Desse modo caro governador Rui Costa, peço que avalie com atenção a nossa singela mensagem, juntamente com a vossa equipe de governo, e com o Partido dos Trabalhadores – PT do Estado da Bahia e reflitam sobre a necessidade da construção de um Estado mais justo, em que as riquezas sejam melhor distribuídas. É necessário que seja apresentado aos baianos desta região qual é o projeto de desenvolvimento que está sendo adotado pelo governo do estado, se realmente está levando em conta a dignidade humana, precisamos entender se as nossas demandas estão sendo acolhidas pelos nossos representantes, não temos a pretensão de nos tornar um eterno curral eleitoral garantido por emendas parlamentares.

Senhor governador, agradeço imensamente a vossa atenção, queremos a condição de sobreviver em paz em nosso Território Municipal. Queremos segurança pública, trabalho, leis ambientais justas e a presença permanente do Promotor de Justiça em nossa cidade.
                  
Cândido Sales 16 de Agosto de 2017.
Atenciosamente,

Welinton Rodrigues
Cidadão candidosalense 

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