segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

VIGILÂNCIA EM SAÚDE, DIREITO DO POVO BRASILEIRO

É necessário reconhecer que corremos o risco de ser surpreendidos com epidemia de dengue e demais vírus que são transmitidos através da picada do mosquito Aedes Aegypti, essa constatação se deve ao fato de o município ter ficado entre os que tiveram a epidemia no ano passado.

Nas informações divulgadas pela imprensa nacional (G1) em publicação que se propõe um raio-X dos casos de dengue pelo país em 2015, o município apresentou uma incidência de 586 casos, a Organização Mundial da Saúde – OMS, considera que há epidemia quando são registrados a partir de 300 casos a cada 100 mil habitantes.

Desse modo, é necessário que a comunidade conheça a estratégia utilizada pela Vigilância em Saúde no município de Cândido Sales-BA para que possa colaborar com as autoridades locais e, avaliar se a quantidade de ações e recursos previstos na estratégia da Vigilância Epidemiológica são o suficiente para atender todo município.

Neste texto o cidadão terá informações sobre os recursos transferidos para o setor de Vigilância em Saúde do município entre os anos 2013 e 2015, e os repasses de recursos ao município no período através de convênios com o Ministério da Saúde. 

A legislação brasileira estabelece que o Sistema Único de Saúde – SUS deve funcionar de maneira organizada e sem interrupção no município e o Art. 198 da nossa constituição estabelece que os serviços de saúde no Brasil devam funcionar de maneira descentralizada, integrada e com a participação efetiva da sociedade.

Cobrar o funcionamento dos serviços de saúde locais que competem ao município é dever de todo cidadão, sendo necessário exigir a promoção, a proteção e a recuperação da saúde, inclusive, o direito constitucional à saúde foi posteriormente fortalecido com a criação da Lei 8.080 em 1990, que regulamenta o direito à saúde e orienta quanto ao funcionamento do SUS nos municípios, Estados e no Distrito Federal, sendo considerada a Lei Orgânica do sistema.

No âmbito da legislação brasileira sobre a saúde, vale salientar que o SANEAMENTO BÁSICO é considerado elemento estruturante de uma região ou território de saúde pela Lei 8.080/90 em seu Art. 3º, a mesma Lei, determina em seu Art. 6º que o Estado (Município, Estado e Distrito Federal) deve garantir ações de vigilância em saúde, assistência farmacêutica e terapêutica em todos os níveis de complexidade.

Uma característica da legislação brasileira sobre saúde, é que ela funciona na perspectiva da descentralização, justamente, para dar mais capilaridade ao SUS e fazer os investimentos em saúde chegarem diretamente ao município, onde as pessoas vivem.

No entanto, esse aspecto da lei, exige dos territórios municipais uma competência que a maioria deles ainda não possui, é o que atesta a pesquisa sobre o índice de gestão fiscal da Federaçãodas Indústrias do Rio de Janeiro – FIRJAN, onde mais de 60% dos municípios brasileiros demonstraram não serem capazes de administrar corretamente.

Ainda na perspectiva da descentralização dos serviços de saúde, o prefeito municipal é considerado como o principal responsável por assegurar o direito aos munícipes, devendo esforçar-se na aplicação da legislação e promover a gestão correta e transparente do SUS, os instrumentos de gestão são determinantes para o financiamento do sistema local.

No Brasil, a saúde é levada a sério, ao menos institucionalmente, e o nosso sistema é desejado por países como os Estados Unidos da América – EUA e se fosse implantado na América do Norte, em dois meses, o SUS atingiria níveis de eficiência que até o presente não foram alcançados por aqui, pois o nosso sistema de saúde é feito para funcionar.

Em 18 de Novembro de 2015 a presidente da República decretou estado de emergência de saúde pública de importância nacional em decorrência dos vírus transmitidos pelo mosquito Aedes Aegypti (dengue, chinkungunya e zika), a última vez que o Estado brasileiro lançou mão de tal instrumento foi em 1917 em decorrência da gripe espanhola.

O decreto presidencial dá a dimensão do transtorno que o mosquito está causando em todo o país, sendo evidente que as sérias deficiências na infraestrutura que o Brasil possui em decorrência do processo de formação da sociedade e da economia nacional influenciam gravemente na qualidade e amplitude das ações de Vigilância em Saúde, no entanto, não podem ser utilizadas como desculpas por governos que ignoram os instrumentos de gestão do SUS, atualmente, o país está sendo constrangido pelo pequeno mosquito, por ainda não ter sido capaz de implementar a sua legislação de saúde pública.

O mosquito está sendo combatido, no entanto, a estratégia utilizada pelo Ministério da Saúde MS tem se demonstrado ineficiente, pois tem o foco na utilização de veneno, não promovendo a limpeza e proteção dos reservatórios, o que evitaria a incidência de novos focos.

Inclusive, o modelo químico-dependente utilizado pelo MS para o controle vetorial do Aedes Aegypti vem sofrendo fortes críticas da sociedade organizada e de setores da academia, justamente por não demonstrar ao longo do tempo que é suficientemente eficaz, para justificar a contaminação reiterada da água de uso diário da população.

Em nota técnica sobre microcefalia e doenças vetoriais relacionadas ao Aedes Aegypti a Associação Brasileira de Saúde Coletiva - ABRASCO  alertou sobre os perigos da estratégia utilizada pelo Brasil a mais de 30 anos para combater mosquito utilizando veneno, a instituição afirma que entre 2014 e 2015 o Brasil notificou 1,5 Milhões de casos de dengue, sendo que metade dos casos ocorreu em São Paulo.

A ABRASCO ainda alerta sobre a necessidade de garantir o Direito Humano à água potável que está sendo desrespeitado pela estratégia adotada pelo Ministério, e quem sofre mais com o envenenamento sistemático do MS são as populações mais pobres, que não dispõem de sistema de água e esgoto e acessam o recurso hídrico por meio de armazenamento precário, favorecendo o desenvolvimento do mosquito.

Desse modo, cabe à população decidir sobre o uso irrefletido de venenos como o MELATHION, principalmente, na água de uso doméstico da população, pois água com veneno não é potável. O foco no veneno é um erro na estratégia adotada pelo Ministério da Saúde.

No último dia 13/02 o Governo Federal realizou o Dia Nacional de Mobilização, o governo convocou todos os entes federados, que, espontaneamente deveriam aderir à convocação, e com base em informações da imprensa brasileira 350 cidades aderiram à convocação para a realização do dia “D” contra a dengue.

A mobilização envolveu ações dos governos estaduais e das forças armadas, que desenvolveram ações conjuntas nas capitais, em regiões metropolitanas e cidades com acima de 300 mil habitantes, no caso do estado da Bahia, foram 6.000 homens do (exército, marinha, aeronáutica) que atuaram no dia “D” na capital e em cidades como Feira de Santana e Vitória da Conquista.

Entre os objetivos da mobilização do dia 13 de fevereiro estava a eliminação de focos do mosquito Aedes Aegypti e entre as ações estaria: a remoção de entulhos e lixo, remoção de recipiente com água parada e orientação quanto às medidas de controle individual como a utilização de telas em portas e janelas e o uso de repelentes.

Na ocasião do dia “D” o Estado da Bahia recebeu em sua capital a visita do Ministro da Saúde Marcelo Castro, que na oportunidade defendeu a estratégia químico-dependente adotada pelo MS e afirmou que não existe relação entre o lavicida utilizado e a microcefalia, ao ser questionado sobre o uso do PYRIPROXYFEN o ministro defendeu-se dizendo que o produto tem registro na ANVISA e que é considerado apropriado para a aplicação no combate do Aedes.   

Pensar globalmente para agir localmente, essa deve ser a estratégia para os que estão em sistemas nulos e querem positivá-los, somos brasileiros na cidade, mas é necessário saber em que contexto estamos inseridos global, nacional e regionalmente. Em se tratando do direito à saúde, os munícipes precisam compreender a parte que lhes compete na participação da gestão da política pública e no controle social.  

O Sistema Único de Saúde – SUS, garante o financiamento da Vigilância Epidemiológica nos municípios e os recursos para o setor são transferidos para o Fundo Municipal de Saúde - FMS através dos repasses feitos pelo Fundo Nacional ao Bloco Financeiro da Vigilância em Saúde do município, Cândido Sales-BA recebeu R$ 578.513,40 em três anos.

O período levantado corresponde a 1º de Janeiro de 2013 a 31 de Dezembro 2015, aspecto que chamou atenção deste movimento quanto aos recursos destinados à vigilância em saúde do município é que de 2013 para 2014 houve uma queda no repasse de 15% mesmo diante do problema da dengue que o país já vem enfrentando há algum tempo.

De 2014 para 2015 o valor variou 9% positivamente o que demonstra uma movimentação deficiente da conta, o certo seria um crescimento do valor desde 2013, pois o combate da dengue já é prioridade a mais de 5 anos no Brasil, essa característica da movimentação do bloco financeiro da Vigilância em Saúde de Cândido Sales-BA, poderá ser esclarecida com a apresentação dos respectivos Relatórios Anuais de Gestão.

A Lei 8.080 de 1990 orienta que os serviços do SUS devem ser disponibilizados de maneira organizada por meio de um Plano Municipal de Saúde que seja construído até Maio do primeiro ano de mandato do gestor municipal e deve se orientar pelo quadro de metas e indicadores municipais, advindos das experiências acumuladas pela gestão e o controle social, principalmente, as propostas aprovadas nas conferências municipais de saúde, inclusive, o plano municipal é requisito para que a cidade receba recursos para o setor, como está estabelecido no Art. 4º da Lei 8.142 de 1990.

O município de Cândido Sales-BA não promoveu nenhuma ação no dia 13 de Fevereiro, Dia Nacional de combate ao mosquito Aedes Aegypti. A secretária de saúde do município informou à comunidade através da rádio local em 02/02/2016 a estratégia desenvolvida pela Vigilância Epidemiológica do município para o enfrentamento da situação de saúde publica.

A estratégia adotada pela secretaria municipal é basicamente a proposta pelo Ministério da Saúde – MS, que tem a utilização de veneno como principal fator de ação. Na entrevista concedida à rádio comunitária a secretária de saúde mais a coordenadora da Vigilância Epidemiológica e um agente de endemias detalharam a estratégia que o município passou a adotar durante esse período crítico do verão, onde existe um maior risco de epidemia.

Com base nos esclarecimentos dados pelas autoridades em saúde pública do município de Cândido Sales-BA, a estratégia adotada pelo SUS Municipal para o combate e controle do mosquito Aedes Aegypti no Território Municipal funciona da seguinte forma: ao ter os sintomas, a pessoa deve procurar imediatamente a Unidade de Saúde do bairro para seja feita uma avaliação clínica, para que em seguida, em caso de confirmação notificar a secretaria.

Após a secretaria ser notificada do caso de dengue, zika ou chinkungunya em qualquer parte do município, será feito o bloqueio da área de onde originou o paciente. Esse bloqueio é feito através da utilização de inseticidas e de larvicidas que são aplicados no raio de 100 m a partir do ponto notificado. Segundo a coordenadora de vigilância epidemiológica, os agentes de endemia encontraram larvas até mesmo nos filtros e potes de água para beber na zona rural do município, o que segundo ela, demonstra a necessidade da comunidade mudar de hábitos.

A propósito, a zona rural do município é responsável pelo maior número de casos de dengue em todo Território, isso em 2015 que o município vivenciou uma epidemia com mais de 300 casos, e em 2016 o município já notificou 47 casos até 02/02, desses 45 são remanescentes da zona rural do município com destaque para a comunidade de Barra do Furado e o distrito de Lagoa Grande que foram responsáveis por 30 e 10 casos respectivamente.

Em 29/02 sai o próximo boletim sobre as notificações de dengue no sistema de saúde de Cândido Sales e a comunidade terá a oportunidade de acompanhar a evolução desses números. Por hora fica a preocupação quanto à fragilidade da estratégia adotada pelo município, que não parece ter origem em planos consistentes.

Basta levarmos em conta a área do município que é de 1.301 quilômetros quadrados, e o distanciamento que existe entre a sede e os demais povoados e distritos. Esse aspecto da logística por si só já é um grande desafio, além disso, para que a estratégia funcione e o hospital não congestione com pacientes de todas as regiões, aumentando o risco de contaminação na sede, é necessário que as Unidades de Saúde estejam funcionando para que possam realizar avaliação clinica das pessoas com sintomas e notificar em caso de confirmação.

Mesmo que as Unidades de Saúde funcionassem plenamente nas respectivas localidades, a secretaria dispõe de 20 Agentes de Endemia em atividade, numa distribuição geográfica de 1 Agente de Endemia a cada 6.505 m o que dificultaria uma ação em que vários pontos fossem notificados, além disso a estratégia não deveria se limitar à utilização de veneno para matar o mosquito, são necessárias ações como a limpeza e proteção dos reservatórios com tela, o que evitaria que o retorno do mosquito.

Outro aspecto da estratégia municipal que chamou a atenção deste movimento é o fato de a Secretaria Municipal ter o prazo de até 15 dias para realizar o bloqueio após a notificação, tempo bastante longo a julgar pela rapidez de propagação do mosquito.

Ao longo desses últimos 3 anos faltaram ações de educação ambiental da parte do governo do município junto à população e aos órgãos do próprio governo, embora recursos tenham sido repassados no período para esse fim, como é o caso do convênio 778841 do município de Cândido Sales-BA com o Ministério da Saúde.

O objeto do convênio que totaliza R$ 113.000,00, cuja primeira parcela foi liberada ao município em 27 de Julho de 2013, como consta no Portal da Transparência, foi para a Promoção de Ações de Educação em Saúde Ambiental, diante da tão propalada deseducação das pessoas quanto ao descarte dos resíduos, o governo local precisa demonstrar onde foram aplicados os R$ 56.500,00 que já foram liberados, desde o primeiro ano de mandato, para investir na educação da população nesse sentido.

Para o exercício do controle social dos recursos destinados à saúde do município é necessário que as pessoas conheçam a legislação do país, o Art. 198 da Constituição que trata do direito à saúde dos brasileiros e as Leis que organizam o sistema de saúde público, as Leis Federais 8.080 e a 8.142 ambas de 1990. É necessário que o cidadão conheça os instrumentos institucionais, principalmente, os indivíduos que ocupam lugar em conselhos de políticas públicas.

Após munir-se do conhecimento necessário, o cidadão deve cobrar dos representantes públicos que os direitos assegurados em Lei sejam respeitados no âmbito do município. Em momento algum a comunidade deve abrir mão de ter serviços de qualidade, e para isso é preciso conhecer como os recursos públicos estão sendo aplicados.

Existem muitas evidências de que a saúde do município não vem funcionando como orienta a Lei 8.080 de 1990 nos últimos 03 anos. Em 2013, por exemplo, Cândido Sales não realizou a conferencia municipal de saúde, que deve acontecer a cada 02 anos, a Lei também estabelece que o Plano Municipal de Saúde, dever ser elaborado até Maio do primeiro ano do mandato do gestor.

A Vigilância Epidemiológica deve funcionar segundo as prioridades estabelecidas no quadro de metas da saúde do município para cada ano, no entanto, é necessário conhecer o porquê de Cândido Sales-BA ter permitido uma situação de epidemia de dengue em 2015, é necessário população entender como essas questões estão elencadas no Plano Municipal de Saúde (2013-2016).

O prefeito do município quando dá declarações públicas sobre a saúde da cidade, alega a dificuldade de financiar os serviços dos quais a população tem direito, no entanto, até o presente momento a população não conhece como os recursos da saúde estão sendo gastos e a que propósitos atendem esses gastos.


Ou seja, o gestor do município de Cândido Sales-BA afirma categoricamente que o problema da saúde local é a FALTA DE DINHEIRO, no entanto, não demonstra através dos instrumentos de gestão (Plano Municipal, Relatório Anual, Quadro de Metas) o que exatamente, o recurso repassado não está sendo o suficiente para financiar.

Essa ausência de transparência quanto aos instrumentos de gestão do SUS, impede o cidadão de conhecer se as ações do governo estão sendo suficientes para enfrentar a demanda identificada. É o caso da Vigilância Epidemiológica e do combate ao Aedes Aegypti no município, vê-se, claramente que o município, ao longo dos três anos, não desenvolveu ações articuladas para orientar a população e eliminar os focos do mosquito.

A problemática da dengue e dos outros vírus que podem ser transmitidos pelo mosquito Aedes Aegypti deve ser enfrentada com bastante seriedade pelo governo municipal, pois se trata de uma questão grave de saúde pública, que, inclusive, chamou atenção das autoridades de saúde de todo o mundo, principalmente, pelas questões atreladas à microcefalia e doenças no sistema nervoso que estão relacionadas aos vírus transmitidos pelo mosquito da dengue.

Diante do alto risco de epidemias relacionadas ao Aedes no município, devido ao grande número de criadouros do mosquito, cabe a cada cidadão cobrar esclarecimentos às autoridades de saúde do município e exigir que os vereadores do município fiscalizem as ações do governo e tomem as providências cabíveis em caso de negligência e omissão da parte do Poder Público Municipal.


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